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ARTIGO TÉCNICO | Estudos Genéticos demonstram que populações de peixes nativos podem estar em risco no Pantanal Matogrossense

ARTIGO TÉCNICO | Estudos Genéticos demonstram que populações de peixes nativos podem estar em risco no Pantanal Matogrossense

Data de Publicação: 25 de maio de 2025 17:17:00 Estudo revela riscos à variabilidade genética da cachara nos rios Seputuba e Cuiabá, enfatizando a necessidade de manejo pesqueiro sustentável.

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Por Ricardo Pereira Ribeiro¹ e Darci Carlos Fornari²

Uma pesquisa realizada nos Rios Seputuba e Cuiabá demonstram que populações de cachara (Pseudoplatystoma reticulatum) podem estar em risco genético e que pode ameaçar o equilíbrio populacional e até inviabilizar a manutenção de populações auto-sustentáveis desta e outras espécies de peixes  do pantanal, tendo em vista que outras espécies encontram-se sob o mesmo tipo de pressão que a do Cachara.

Neste estudo, publicado na Revista Semina, em 2021, o grupo de pesquisadores do Departamento de Zootecnia da Universidade Estadual de Maringá, em parceria com pesquisadores da Embrapa Pantanal e empresas de Mato Grosso, os pesquisadores realizaram um estudo genético em 224 animais capturados nos rios Seputuba e Cuiabá, demonstraram uma média de número de alelos efetivos (Ne)  de 3,366, demostrando que os alelos microssatélites foram informativos e permitiram obter dados suficientes para avaliar a variabilidade genética na população.

Número de alelos (Na), número de alelos efetivos (Ne), Índice de Shannon (I), Heterozigosidade observada (Ho), Heterozigosidade esperada (He), Coeficiente de endogamia (Fis) e teste do equilíbrio de Hardy-Weinberg (Hw) para estoque de cachara (Pseudoplatystoma reticulatum)

Locus

Na

Ne

I

Ho

He

Fis

Hw (p valor)

BR47

3,0

1,654

0,709

0,444

0,395

-0,113

0,129

ns

PPU9

9,0

7,736

2,105

0,860

0,871

0,024

0,582

ns

 PPU13

2,0

1,550

0,540

0,205

0,355

0,433

0,008

**

 PPU10

11,0

6,499

2,059

0,625

0,846

0,271

0,008

**

  PCOR1

6,0

2,909

1,265

0,565

0,656

0,149

0,000

***

  PCOR8

5,0

1,897

0,957

0,432

0,473

0,098

0,708

ns

    PCOR10

4,0

1,317

0,476

0,250

0,241

-0,026

0,000

***

Média

5,714

3,366

1,159

0,483

0,548

0,119

0,205

ns = não significante , * P<0.05, ** P<0.01, *** P<0.001

A cachara em estudo (Foto: dos pesquisadores/divulgação)

Segundo a estes dados demonstrados, a média da heterozigosidade esperada (He = 0,548) foi superior à heterozigosidade observada (Ho = 0,483), o que indica uma redução na variabilidade genética, ou seja, um aumento da consanguinidade da população analisada. Esse resultado é reforçado pelo coeficiente de endogamia (Fis = 0,119), que apresentou valor positivo, sugerindo ocorrência de cruzamentos entre indivíduos geneticamente semelhantes ao longo de vários anos nestes rios. Este padrão também é evidenciado pelo elevado número de alelos de baixa frequência.

Esta condição genética “perigosa”, pode estar associada à pressão de seleção negativa imposta ao longo dos anos, por vários motivos, um destes motivos pode ser a prática de pesca seletiva baseada no tamanho mínimo dos indivíduos. Essa estratégia tende a manter no ambiente apenas os indivíduos com características genéticas similares, apenas animais abaixo do tamanho mínimo, enquanto aqueles com maior tamanho que fazem parte fundamental na distribuição da variabilidade genética populacional, são retirados pela pesca extrativista, o que pode estar promovendo um estreitamento do “pool” genético — fenômeno conhecido como estrangulamento genético.

Em populações naturais, a variabilidade genética pode ser influenciada por múltiplos fatores, incluindo barreiras geográficas, estrutura populacional diferenciada e processos de deriva genética o que inclui a retirada seletiva de determinados tipos de indivíduos de uma população, ou seja a pesca seletiva pode causar este estrangulamento genético.

Os autores do trabalho afirmam que este fato pode se caracterizar em uma seleção não intencional que pode causar a perda de variabilidade e estrangulamento genético e, por fim, causar danos à integridade genética da população, com efeitos drásticos

O equilíbrio de Hardy-Weinberg (Hw), que indica a estabilidade genética de uma população ao longo das gerações, mostrou-se significativo para os primers PCOR1 e PCOR10, indicando poucos alelos heterozigotos, por consequência de fatores como: entrecruzamentos, acasalamento não-aleatório, seleção, ou deriva genética para esses locus (Rodriguez-Rodriguez et al., 2013). Efeitos similares ocorreram também para outros dois primers PPPU13 e PPU10, no entanto, em menor proporção. Esses desvios no equilíbrio de Hardy-Weinberg podem ser atribuídos à baixa variabilidade genética.

Com base nos resultados deste trabalho, é possível inferir que as populações de cachara (P. reticulatum) nos rios Sepotuba e Cuiabá apresentam níveis baixos de variabilidade genética. O estudo sugere que a restrição da pesca nessas populações por um período poderia auxiliar em sua recuperação e no retorno ao equilíbrio genético.

Para fundamentar políticas públicas de manejo pesqueiro, é essencial realizar pesquisas adicionais que abranjam outras espécies e rios. Essa abordagem holística proporcionará uma compreensão mais abrangente dos ecossistemas aquáticos. Além de desenvolver novas políticas, é igualmente importante monitorar continuamente os efeitos de medidas já implementadas, como a “lei do transporte zero”. Essa lei visa aumentar as populações de peixes, mas seu sucesso depende da manutenção da divergência e variabilidade genética das espécies.

A preservação dessas características genéticas é crucial para garantir a resiliência ecológica e a segurança ambiental dos peixes nos rios. Estudos sistemáticos permitirão ajustes nas políticas, assegurando que as estratégias de conservação sejam eficazes a longo prazo, maximizando a sustentabilidade das populações e a saúde dos ecossistemas hídricos.

 

 

1 - Zooecnia (Bacharelado) Universidade Estadual de Maringá (UEM), 1987; Mestre em Genética e Melhoramento Genético, e Doutor em Ecologia de Ambientes Aquáticos Continentais – NUPELIA/UEM, - Professor Associado do Departamento de Zootecnia da Universidade Estadual de Maringá, atua nas áreas de Genética e Melhoramento Genético de Peixes, Manejo e Planejamento em Projetos de Piscicultura de Água Doce, Reprodução e Biotecnicas Reprodutivas, além Avalição Genética de Populações de Peixes e Projetos de Avaliação Ambiental.  Possui mais de 200 artigos publicados em revistas indexadas nestas áreas do conhecimento.     rpribeiro@uem.br,

2 -  Zootecnia (Bacharelado) - Universidade Estadual de Maringá (UEM), 2003; Mestre e Doutor em Produção Animal - UEM, com foco em biotecnologia da reprodução de peixes nativos. Pós-Doutorado - Universidade de Auburn, EUA (2019 – 2021). Pós-Doutorado - Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), vigente. Atua nas áreas de Aquicultura, Nutrição de peixes, Reprodução de peixes nativos, Projetos de piscicultura sustentável, Avaliação de impactos ambientais. Grande experiência em aquicultura, dedicado ao desenvolvimento de práticas sustentáveis e avaliação de impactos ambientais. Com formação sólida e formação pós-graduada em renomadas instituições,    darci.peixegen@gmail.com

Referência:

Jefferson Murici Penafort; Laís Santana Celestino Mantovani; Gabriela Hernandes Granzoto; Pedro Luiz de Castro; Luiz Fernando de Souza Alves; Felipe Pinheiro de Souza; Nelson Maurício Lopera-Barrero; Carlos Antônio Lopes de Oliveira; Ricardo Pereira Ribeiro, Obtaining microsatellite markers for Pseudoplatystoma reticulatum using heterologous primer. Semina: Ciênc. Agrár. Londrina, v. 42, n. 3, p. 1323-1334, maio/jun. 2021. DOI: 10.5433/1679-0359.2021v42n3p1323.

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