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EMBALAGEM INTELIGENTE: Dispositivo natural muda de cor para avisar que o peixe estragou

EMBALAGEM INTELIGENTE: Dispositivo natural muda de cor para avisar que o peixe estragou

Data de Publicação: 7 de maio de 2025 10:34:00 Uma revolução nas embalagens: tecnologia brasileira identifica a deterioração de alimentos por meio de mudança de cor.

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As mantas, utilizadas como embalagens, são capazes
de monitorar a qualidade de alimentos em tempo real
pela alteração da cor (Foto: Matheus Falanga)

Da Agência Embrapa de Notícias

Uma nova tecnologia desenvolvida por cientistas brasileiros promete revolucionar a forma como identificamos alimentos impróprios para consumo: uma embalagem que muda de cor conforme o alimento se deteriora. O sistema, que utiliza pigmentos naturais extraídos do repolho roxo, foi criado por pesquisadores da Embrapa Instrumentação (SP), em parceria com Embrapa Agroindústria de Alimentos (RJ) e a Universidade de Illinois, em Chicago, nos Estados Unidos (UIC).

Foto: Matheus Falanga

A inovação da ciência brasileira foi empregar a técnica de fiação por sopro em solução para produzir mantas de nanofibras inteligentes usando pigmentos vegetais naturais. As mantas, utilizadas como embalagens, são capazes de monitorar a qualidade de alimentos em tempo real pela alteração da cor. A alteração da embalagem é desencadeada pela interação química entre os compostos liberados durante a deterioração e o material da embalagem. Em testes em laboratórios, a manta apresentou ótimos resultados, mudou de roxo para azul durante o monitoramento do frescor do filé de merluza.

Foto: Matheus Falanga

A cor roxa indicou que o alimento estava apropriado ao consumo (foto à direita). Mas, depois de 24 horas, a cor tornou-se menos intensa e, após 48 horas, surgiram tons azul-acinzentados. Passadas 72 horas, a coloração azul sinalizou a deterioração do filé de peixe armazenado, sem a necessidade de abrir a embalagem.

Para os pesquisadores da Embrapa, os resultados mostram que mantas compostas de nanofibras se comportam como materiais inteligentes, exibindo mudanças visíveis na cor durante o processo de deterioração de filés de peixe. Porém, embora essa característica aponte uso potencial das mantas no monitoramento do frescor de peixes e frutos do mar, os cientistas dizem que há necessidade de ampliar os estudos para validar sua aplicação em diferentes espécies.

Foto: Matheus Falanga

SBS é alternativa à técnica convencional

A técnica de fiação por sopro em solução (SBS, do inglês Solution Blow Spinning), desenvolvida em 2009 por pesquisadores da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), da Embrapa Instrumentação, em parceria com o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA), é capaz de produzir micro e nanoestruturas poliméricas, e apresenta diversas vantagens. Entre elas, a rapidez no desenvolvimento das nanofibras, que leva apenas duas horas.

A técnica ainda apresenta escalabilidade, versatilidade, fácil manejo, além de ser de baixo custo e utilizar forças aerodinâmicas para a produção das nanofibras, o que reduz muito o consumo de energia. A técnica foi descrita pelos autores em artigo no Journal of Applied Polymer Science.

As nanofibrassão estruturas em escala nanométrica que podem formar não tecidos. Um nanômetro é equivalente a um bilionésimo de um metro. “Os estudos anteriores sobre nanofibras inteligentes contendo antocianinas extraídas de alimentos haviam sido conduzidos exclusivamente usando a técnica de eletrofiação”, conta Josemar Gonçalves de Oliveira Filho, que desenvolveu o processo em seu pós-doutorado. A eletrofiação, tradicionalmente utilizada com nanofibras, apresenta várias limitações, como baixa escalabilidade, altos custos, baixo rendimento, necessidade de 24 horas para produção e uso de altas voltagens.

Foto: Matheus Falanga

Manta é reforçada com pigmentos naturais

O estudo de Oliveira Filho foi supervisionado pelo pesquisador da Embrapa Luiz Henrique Capparelli Mattoso, no Laboratório Nacional de Nanotecnologia para o Agronegócio (LNNA). Parte da pesquisa foi realizada no Departamento de Engenharia Mecânica e Industrial da Universidade de Illinois, em Chicago (EUA).

No estudo, os pesquisadores utilizaram antocianinas e o polímero biocompatível e biodegradável, conhecido como policaprolactona. As antocianinas são pigmentos naturais encontrados em algumas plantas, frutas, flores e vegetais, que exibem uma ampla gama de cores como vermelho, rosa, azul, roxo, cinza, verde e amarelo.

"Transformando o desperdício em segurança: a embalagem que vê o que nossos olhos não conseguem."

Elas mudam de cor conforme o pH (grau de acidez ou alcalinidade) do meio em que se encontram. Na pesquisa, as antocianinas foram extraídas de resíduos de repolho roxo. Como o repolho roxo é rico em antocianinas, pode ser utilizado como indicador de pH. O estudo testou mais de dez pigmentos, a maioria de vegetais. “As nanofibras demonstraram capacidade de monitorar a deterioração de filés de peixe em tempo real, revelando potencial como materiais de embalagem inteligentes para alimentos”, avalia Oliveira Filho.

Foto: Matheus Falanga

O pós-doutorando (foto à direita) esclarece que, embora, as pesquisas sobre o uso de antocianinas de resíduos alimentares na produção de outros materiais inteligentes estejam documentadas na literatura, as informações são escassas sobre a aplicação desses extratos na produção de nanofibras inteligentes.

Já Mattoso explica que a policaprolactona, polímero biodegradável usado na embalagem, possui boa flexibilidade e resistência mecânica, o que é vantajoso para a proteção de alimentos. Além disso, tem potencial para uso em uma ampla gama de solventes e baixa temperatura de fusão, o que facilita o processamento com menor consumo de energia.

“Por isso, é considerada uma alternativa para o desenvolvimento de nanofibras para diversas aplicações. Quando combinadas com antocianinas, as nanofibras apresentam uma capacidade notável de monitorar mudanças de pH, detectar a produção de amônia e aminas voláteis, além de identificar o crescimento de bactérias. Esses indicadores são essenciais para sinalizar a deterioração em produtos como peixe e frutos do mar”, detalha o especialista em nanotecnologia.

Foto: Matheus Falanga

Uso de resíduos ajuda a reduzir perdas de alimentos

Oliveira Filho diz que a produção da manta de nanofibras e inicia com uma solução polimérica, obtida pela mistura e agitação da policaprolactona, extrato de repolho e do ácido acético. Em seguida, essa solução é introduzida no equipamento de SBS, que é composto por uma fonte de gás comprimido, um regulador de pressão para controlar o fluxo de gás, uma bomba de injeção que direciona a solução para a matriz de fiação com bico, e um coletor com velocidade de rotação ajustável, onde as nanofibras são depositadas para formar a manta. O processo final resulta em fibras em escala nanométrica, similares a fibras de algodão.

Mattoso lembra que usar resíduos do setor varejista para extrair antocianinas e aplicá-las como indicadores colorimétricos pode agregar valor a esses alimentos descartados, ao mesmo tempo em que reduz o impacto ambiental negativo do descarte. Além disso, pode trazer segurança aos alimentos armazenados ao detectar rapidamente a sua deterioração.

Foto: Matheus Falanga

Os dados da pesquisa foram publicados no artigo “Fast and sustainable production of smart nanofiber mats by solution blow spinning for food quality monitoring: Potential of polycaprolactone and agri-food residue-derived anthocyanins” na revista Food Chemistry.

A pesquisa foi apoiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) por meio do INCT Circularidade em Materiais Poliméricos, liderado pela Embrapa Instrumentação.

 

*Texto produzido pela jornalista Joana Silva, da Embrapa Instrumentação

   

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